Considerações sobre o big bang

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Numerei as principais considerações a respeito dos principais equívocos (e os mais graves também) que observo que há em relação ao big bang e à teoria explicativa. Ad cautelam!
1- O big bang não foi uma explosão. Explosão é o arremesso de um conteúdo que se mova propriamente e em relação ao centro da explosão, em um espaço circundante preexistente. Após o big bang, o conteúdo não se distanciou, mas houve afastamento pois o espaço em si se expandiu, carregando tudo que estava nele, sem, no entanto, o conteúdo ocupante sair do lugar. O que aconteceu é que cada vez mais lugares foram surgindo entre o espaço que separava os conteúdos, isto é, o espaço inchou. Pode haver movimento relativo e próprio das galáxias sim, detectados pelos “blue shifts”, mas isso se dá em regiões em que a expansão não é notável. Em escalas de distâncias até as galáxias mais próximas, a expansão pode ser considerada desprezível, pois a taxa de variação de separação entre os sistemas é diretamente e linearmente proporcional a distância em que se encontram os sistemas que se afastam (lei de Hubble). Somente em escalas de distâncias cosmológicas é que se tem expansão do espaço notável. E essas distâncias são da ordem de centenas de milhões ou até bilhões de anos luz.

2- Não havia energia pura no início dos tempos. Há que se separar bem o que cada elemento é, bem como classificá-lo em alguma categoria da realidade. Energia assim, é uma propriedade e não uma entidade. Matéria é uma entidade, isto é, uma coisa, algo que se pode conceber existindo substancialmente (filosoficamente falando). Energia então é uma qualidade, um atributo, algo que se pode conceber como caracterizando alguma coisa. Outros exemplos de atributos de coisas são comprimento, volume, massa, spin, paridade, helicidade, carga, intensidade, posição e afins. Atributos de interação são força, impulso, torque, trabalho e calor. Atributos do movimento são momentum linear, momentum angular, velocidade, aceleração, inércia e outros. Grandezas são mensurações quantificadas dos atributos ou propriedades. Assim, existe uma grandeza que quantifica cada atributo desses que eu falei, geralmente do mesmo nome que o atributo em si, como o é “energia”. Energia é uma grandeza que mede a capacidade que algo contém de agir, isto é, executar ações que encadeiam em modificações no estado do conteúdo do universo. Matéria é uma das substâncias do universo e portanto é uma entidade. Mas também é um “ser” porque é uma entidade que de fato existe, e não é mera abstração. Dentre os atributos da matéria, encontra-se energia. Mas o que havia no início dos tempos não era nem matéria! Era campos, que se encontravam desquantizados, porém indiferenciados e eram uniformes. Esses campos continham uma grande quantidade de energia, que depois se transformou em massa e outros tipos de energia, valendo a lei de conservação (depois volto nas leis). Portanto, o big bang não foi uma explosão energética (esse para mim, é o maior equívoco que se pode cometer a respeito, e eu acabei de mostrar que são mesmo, por mera questão de definição).

3- O big bang não foi o surgimento do universo. O big bang foi um evento que marcou o início da expansão e da passagem do tempo. Isso se deu já com o espaço existente e o conteúdo nele imbricado. Isto é, a teoria do big bang nem mesmo explica o que originou o conteúdo primordial acoplado no continente espacial. Assim, a teoria do big bang é uma teoria da expansão e evolução do universo partindo de momentos infinitesimais não nulos. A teoria (que é um modelo explicativo da realidade devidamente confirmado, verificado, justificado e revisado) do big bang descreve as ocorrências, as entidades, as propriedades das entidades e das ocorrências e como isso tudo evoluiu na medida que o tempo passou. É correto falar que o big bang é a origem do tempo e da expansão, mas não o é falar que é a origem do universo. Quanto a dizer que é a origem da matéria, digo que não. Digo que a matéria foi consequência dos eventos que se sucederam “a posteriori”, assim como a radiação. Já a origem dos campos (que é o que se tem de mais básico na natureza), não se sabe como se deu, em que se pese as propostas de Roger Penrose, Sean Carroll, Steven Weinberg, Alex Vilenkin, Mário Novello, Alan Guth e outros.

4- O big bang não originou as “leis da física”. Primeiro que, as leis da física não são algo apriorístico no universo. Com um simples exame de lógica, pode-se mostrar que não. O que quer que tenha acontecido que fez com que o universo surgisse, não pode ter “seguido” nenhuma lei, pois leis são descrições empíricas do comportamento natural. Sem haver espaço, tempo, campos, radiação, matéria, estruturas e ocorrências, não se tem nada físico existente. Logo, nada natural. Portanto, não há como descrever nada, uma vez que nada existe. Então as leis não tem aplicabilidade. Isto é, o próprio surgimento do universo pode não ter seguido nenhuma lei! As leis se aplicam ao universo já existindo. E as leis da física são descrições e não prescrições. Descrever é dizer como acontece, prescrever é determinar que algo aconteça. Isso é muito diferente. O comportamento da natureza se dá por conta própria. Não existem “leis da física” como entidades. Elas são construtos humanos. Acontece que se observa e experimenta-se certos comportamentos da natureza, em que se observa uma certa regularidade e certas propriedades, como por exemplo, a conservação da energia, o movimento inercial, a invariância da velocidade da luz, a permanência do conteúdo substancial material, o comportamento probabilístico e o indeterminismo em escala atômica e subatômica, etc. Isso tudo pode ser descrito. Mas a natureza não evolve “seguindo” essas leis. As leis não são necessidade nenhuma. O universo poderia existir com leis totalmente diferentes. Inclusive, nem se garante que o próprio comportamento não pode mudar.

5- O big bang absolutamente não implica que o universo foi criado (nem que teve uma causa)! Por mais que a ideia tenha sido desenvolvida primordialmente por Georges Lemaître, que era uma padre belga, ela se baseia na relatividade geral, e outros cientistas também entraram na disquisição, como George Gamow, Ralph Alpher, Hans Bethe, Robert Dicke, Edwin Hubble, Alexander Friedmann e o próprio Albert Einstein. Como foi explicado acima, o modelo explicativo chamado de “big bang” (impropriamente, foi cunhado por Fred Hoyle em uma transmissão de rádio demonstrando desdém a teoria) não aborda a origem do universo. Então é um grande absurdo falar que implica que o universo foi criado. Deus (ou qualquer outra entidade supernatural transcendental), existindo ou não, não interfere em nada na validação da teoria, esta que, em última instância, deve ser validada e confirmada acessoriamente pela razão e pela verificação das evidências empíricas, bem como com o cotejo sistematizado de tudo isso e as tentativas de se refutar a própria teoria. Se o universo for eterno, então não houve big bang, pois o big bang implica também no início da passagem do tempo e sendo eterno, por definição, sempre houve decurso do tempo. Então o que poderia haver seria um “big bounce” e não um “big bang”. Finalmente, queria comentar que causalidade não é necessidade nenhuma. Como Werner Heisenberg já bem percebia há quase um século atrás: “A física quântica forneceu a refutação definitiva do princípio da causalidade”. Já escrevi um texto sobre isso, vejam: http://slvzanin.blogspot.com.br/2017/02/refutacao-do-argumento-do-teologo.html

6- No big bang, não era o universo inteiro que estava contido em uma região menor que um elétron e sim o universo observável. Universo observável é a porção do universo que se consegue ter acesso a observação pois houve tempo da luz chegar até nós. Nós somos o centro do universo observável, pois somos os observadores dessa determinada porção do universo. Universo inteiro não engloba somente os lugares que se pode ver pois houve tempo da luz chegar até nós, mas todos os lugares e todos os momentos. Universo é o conjunto de tudo o que existe em todos os lugares e momentos. No entanto, se o universo for infinito, ele assim o foi desde que surgiu. Isso quer dizer que mesmo no big bang, ele já surgiu infinito. Infinito não é um número, nem um lugar. É um símbolo de indeterminação. É um limite. Quer dizer um valor que é maior que qualquer outro que se possa conceber. O universo pode ser tanto finito ou infinito, mas é ilimitado, por definição. Sendo finito ou infinito, o big bang também se aplica.

7- O big bang não foi uma singularidade (nem adveio de uma). Em verdade, a singularidade apenas é uma situação em que se não tem conciliação das explicações dadas pelas teorias mais fundamentais da natureza: relatividade e quântica. Ainda não se sabe como resolver o “problema da singularidade”, pois se fato existiu mesmo uma singularidade, as leis da física não se aplicam. Mas nada impede que o próprio universo já tenha surgido em um volume infinitesimal, mas não nulo, com as ocorrências então, descritas pela teoria do big bang. Portanto, o big bang não “foi” uma singularidade e nem dela adveio.

Alguns comentários extras: Além da possibilidade do universo ter surgido, há a de que é eterno e de que nem surgiu e nem é eterno, mas apenas passou por uma transição, de uma configuração estática, embora seja difícil admitir essa hipótese. A teoria do big bang em verdade já foi corrigida, pela teoria inflacionária de Guth, Linde, Steinhardt e outros. A teoria parece resolver alguns problemas que a teoria do big bang quente ou convencional não resolve, como o problema da planaridade, da estrutura em larga escala, problema do horizonte e dos monopólos magnéticos. Juntamente com a teoria quântica de campos e relatividade geral, tem-se uma boa descrição do que ocorreu momentos depois que o universo existiu. Quanto a época de Planck, sabe-se muito pouco. A relatividade geral prevê algo que não é consistente com a teoria quântica. A época de Planck marca justamente esse limite de compreensão fenomenológica, uma vez que para tempos menores que o de Planck, aparentemente não há como se descrever. A teoria do big bang está longe de ser a melhor teoria da evolução e expansão do universo (como eu disse, foi até complementada pela teoria inflacionária). Muitos problemas ainda não estão resolvidos. Nem mesmo a teoria da inflação resolve. No entanto, muitos erros (principalmente conceituais) cometidos a respeito, obstruem uma compreensão mais clara e correta dos fatos.

Referências:

https://en.wikipedia.org/wiki/General_relativity
https://www.youtube.com/watch?v=P-medYaqVak&list=PLpGHT1n4-mAuVGJ2E1uF9GSwLsx7p1xtm
https://www.youtube.com/watch?v=dA1_yYOoGtM
https://www.youtube.com/watch?v=PsfyE1-s9Rs
https://en.wikipedia.org/wiki/History_of_the_Big_Bang_theory

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